"Gato", borda de pizza e trens: a vida de Renato até virar titular do Palmeiras

26/12/2014 08:36

"Gato", borda de pizza e trens: a vida de Renato até virar titular do Palmeiras

Nascido em Caieiras, na Grande São Paulo, volante do Palmeiras lembra dificuldades do passado e tenta seguir os passos amigo e conterrâneo Marcos Assunção

Renato está reformando a casa dos pais em Caieiras

(Foto: Felipe Zito)




– Minha vida daria um livro.



O volante Renato tem 22 anos e apenas uma temporada como titular do Palmeiras. Mas a história de vida do jovem nascido em Caieiras, cidade da Grande São Paulo, fã de Marcos Assunção, de quem é conterrâneo, e orgulho da família Santos rende bons capítulos em uma rica história de superação, dificuldades e vitórias. Tudo isso pelo sonho, agora concretizado, de vestir a camisa de um grande clube do futebol brasileiro.



Antes de chegar ao Verdão, o volante, que hoje ganhou a confiança da exigente torcida, teve de driblar obstáculos inesperados, como a rotina nos transportes públicos de São Paulo, a distância da família e até a fome.



Ainda garoto, no campo do Nacional Esporte Clube, em Caieiras, Renato começou a buscar seu espaço no futebol. Apesar de ter começado como atacante goleador, como o próprio se definia, o "Pulguinha" cresceu e foi tentar a sorte mais recuado, no Barueri e depois no PAEC.



– Eu era centroavante. É até incrível falar uma coisa dessa, mas era goleador. Minha mãe até hoje puxa minha orelha e pergunta por que não continuei como atacante. Só que o tempo foi passando, fui crescendo, a habilidade foi saindo um pouco também e fui indo para trás. Hoje estou perto dos zagueiros e daqui a pouco estou com os goleiros (risos) – brinca.



Maratona para treinar



As primeiras tentativas mostraram logo de cara que a realidade no futebol seria difícil. Determinado, Renato abdicou das diversões da juventude e, apoiado pelos pais, correu atrás do sonho. Ainda morador de Caieiras, o volante hoje não se importa com a distância de casa até a Academia de Futebol. Afinal, de carro é mais confortável. O difícil era a rotina de transporte público e caminhadas por São Paulo no começo da carreira.



– Quando não tem trânsito, em 40 minutos no máximo estou no Palmeiras. Mas isso não se compara com a vida que eu tinha antes. Quando não pegava ônibus, pegava dois trens e andava mais meia hora para não gastar dinheiro da condução. Chegava aquecido, mas valia de tudo para economizar na passagem – conta Renato, sobre o percurso até Barueri.



– Minha mãe trabalhava de empregada doméstica, era difícil pegar o dinheiro e dar para eu gastar na passagem. No PAEC era mais longe ainda. Pegava dois ônibus e três trens. Dava umas 30 estações até chegar lá. Depois, quando o clube começou a ajudar, comecei a ir de ônibus. Era no mínimo duas horas e meia, isso quando atrasava trem ou tinha tumulto – completa.



No Grêmio, competição com "gato"



As dificuldades fizeram Renato desanimar, mas não desistir. Incentivado pela mãe, voltou a correr ao lado de amigos no estádio de Caieiras.



E após um jogo para empresários em sua cidade, o atleta teve a chance para um período de testes no Grêmio. O objetivo inicial era permanecer 15 dias em Porto Alegre e retornar para São Paulo. Mas, aprovado, permaneceu no Sul por um ano inteiro, até que uma das artimanhas do futebol adiou mais uma vez seu sonho.



– O empresário me falou que eu ia fazer uns testes por duas semanas, e que se gostassem eu voltaria para minha casa antes de ficar lá. Na primeira semana, machuquei o tornozelo, mas me recuperaram. Fui com roupa para ficar 15 dias e fiquei o ano todo. Depois que eu passei no teste, a ajuda de custo era R$ 300. Aí eu comprava uma camisa e um short num mês, depois no outro comprava um tênis e uma camisa – conta.



O jogador acabou dispensado quando surgiu outro volante, mais técnico, chamado Darlan. Detalhe: o rival de Renato era "gato" - ou seja, havia alterado a idade para poder ser aprovado na base do Grêmio.



– Tinha escanteio de um lado, ele (Darlan) batia com a esquerda, depois do outro lado batia com a direita, jogava muito. O Grêmio falou que ia me liberar porque o Darlan tinha chegado muito bem. O time era de jogadores nascidos em 1991/1992, eu sou de 92 e tinha chegado outro de 92 melhor que os de 1991. Eles me liberaram. Passou um tempo e fui para o Santo André.



Foi no ABC que Renato descobriu que Darlan era "gato".



– Chegando lá (no Santo André), quem me manda mensagem? O Darlan, perguntando se não tinha como eu arrumar um teste para ele lá. Eu perguntei o motivo, ele disse que tinha saído do Grêmio. Eu falei que era estranho, porque ele tinha chegado arrebentando. Aí ele falou que tinham descoberto o “gato” dele, ele era de 1988. Eu estava treinando, dando a vida nos treinos, e o cara era quatro anos mais velho...







Borda da pizza dos outros para matar a fome

Apesar das dificuldades, Renato conta a trajetória até o Palmeiras com bom humor. E usa como exemplo tudo o que teve de enfrentar na carreira. Um dos episódios mais complicados aconteceu no interior de São Paulo.



Com 18 anos, o atleta buscou sua primeira oportunidade como profissional bem longe de casa. Apesar de preferir não citar o nome do clube, o atleta não tem vergonha de falar que chegou até a passar fome por lá. Mas a amarga experiência foi driblada com a ajuda dos companheiros.



– Tinha ido numa pizzaria, era rodízio, e o pessoal não comia a borda da pizza para não encher muito rápido. Teve uma vez em que eu estava sem dinheiro para ir e também não tinha dinheiro para comprar a bolacha da noite. A janta era 18h e só tinha o café da manhã no dia seguinte, às 8h.



Cheguei e perguntei se ninguém ia me zoar. Aí pedi para eles trazerem a borda da pizza para eu comer. Aquela foi a noite que eu dormi mais feliz, de barriga cheia – diz Renato, emocionado.



– Para você ver as coisas que o cara passa e ninguém imagina. Aí, quando você está no profissional, vem alguém e fala que você deu sorte, que a vida do cara é fácil. As pessoas querem o que você tem, mas não querem passar o que você passou – completa.



Pupilo de Marcos Assunção



"Vizinho" de Marcos Assunção em Caieiras, Renato diz que o ídolo foi fundamental para a sua chegada ao Palmeiras. Foi o ex-volante da seleção brasileira quem o levou ao Verdão para um período de testes na Academia de Futebol.



Ao chegar ao clube e ver a estrutura oferecida aos garotos das categorias de base, Renato já sabia que, depois de tantas dificuldades, havia chegado a hora de triunfar no futebol e realizar o sonho de se fixar com a camisa de um grande clube do futebol brasileiro.



– Quando eu cheguei ao Palmeiras, eu dava valor a tudo: minha cama, comida. Já falei outras vezes que eu não via a hora de acabar o treino porque a comida era muito boa. Se eu não tivesse passado por tudo isso talvez eu poderia chegar a outro clube e falar que era normal. Mas quando eu cheguei ao Palmeiras, vi o clube, o uniforme de treino, o campo, eu liguei para o pessoal e falei: fiquem tranquilos que vou passar no teste – recorda.



Estágio em Portugal



Antes de se fixar no elenco alviverde, uma viagem para fora do Brasil. Renato foi emprestado para o Moreirense, clube que disputava a primeira divisão do Campeonato Português. Além da experiência profissional de atuar no futebol europeu, o palmeirense retornou para Caieiras com mais uma conquista na bagagem: o amor da esposa.



– Saí da base do Palmeiras e lá joguei contra o João Moutinho, o James Rodriguez, o Lima, o Cardozo, o Luisão... Foi uma experiência incrível. Joguei em estádio com 60 mil pessoas pela primeira vez na vida.



Eu olhava e pensava que era um sonho realizado, mas sabia que não podia parar por ali. Se não correr atrás você para no meio do caminho. A dificuldade lá foi pelo campeonato, mas não tinha a pressão da torcida. Eram cinco mil torcedores, aqui são 18 milhões.



Lá, se você joga uma partida mal, tem dois ou três criticando. Aqui, se você vai mal, sai um cartaz teu até no meio da rua se bobear (risos) – cita.



– Foi lá (em Portugal) que conheci minha mulher, uma pessoa que sempre me deu muita força. Eu não tinha ninguém por lá, e os pais dela me acolheram como um filho, cuidaram de mim. Quando eu voltei para o Brasil a trouxe comigo – diz o palmeirense.



Titular na fogueira



Apesar de ter participado da campanha no Campeonato Brasileiro da Série B, Renato se firmou entre os titulares do Palmeiras em 2014. E na fogueira, como dizem no futebol, já que a equipe passou grande parte do tempo lutando contra um novo rebaixamento para a segunda divisão.



Mesmo nas dificuldades, o volante cita um ponto positivo na campanha alviverde desta temporada: o surgimento de bons talentos nas categorias de base do clube.



- Quem ficar depois deste ano difícil estará preparado para tudo. Como foi um ano difícil e complicado, sempre tem alguma coisa boa para tirar. Foi essa parte da pressão, da ansiedade, e isso conta muito.



Tenho certeza que em 2015, nas horas das adversidades, vamos saber tratar da melhor maneira possível.

Apesar da pouca idade, Renato foi importante para os novatos João Pedro e Nathan, que subiram para o profissional na reta final do Brasileirão.



– A cobrança é grande, mas foi válida. Quando você vive a parte boa, acha que nada pode dar errado. Eu achava que nunca ia errar. Às vezes, não me concentrava tanto, sabendo o que eu ia fazer, até que as coisas deram errado e sofri bastante.



Quando o João Pedro e Nathan começaram a jogar, eu falei que não ia deixar acontecer com eles o que aconteceu comigo. Foi muito difícil. Postava uma foto na internet só para ver o pessoal elogiando. Depois, quando chegou a semana ruim, fiquei seis semanas sem postar nada (risos) – brinca.



Com contrato renovado até 2019, Renato mantém as origens humildes, mas cita com orgulho o fato de poder ajudar os pais. A casa em Caieiras, a poucos metros do campo em que começou a jogar, está sendo totalmente reformada. E ali, perto do Nacional, a família promete ficar na torcida por uma carreira vitoriosa do atleta no Palmeiras.



– Aqui foi onde tudo começou, onde tive alegria. Foi o começo de uma história que não sabia se ia dar certo ou não. Mas sempre tive uma esperança de que um dia ia sair daqui e jogar num grande estádio, numa grande equipe.



Hoje, eu volto muito feliz por tudo o que já passei e vivi aqui. Já corri, treinei, brinquei aqui. Este campo faz parte da minha vida. Aqui só tenho saudade da época de criança, mas é legal voltar e saber que venci- conclui.



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8601 visitas - Fonte: Ge

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