Allianz Parque e a Vassoura do Desprezo

25/10/2016 14:06

Allianz Parque e a Vassoura do Desprezo

Allianz Parque e a Vassoura do Desprezo

Nunca vai caber em um plano cartesiano, mesmo: o momento mais contagiante que participei nesta campanha foi a saída pelo Tobogã após o maluco Palmeiras 4x3 Grêmio. Duas viradas, gol relâmpago, gol espírita, falha absurda do juiz e muita, mas muita chuva. Debaixo da arquibancada, espremidos, nos vingamos de São Pedro por vários minutos cantando "Palmeiras minha vida é você" em um interminável looping de tom ecumênico que não perdia força, só ganhava, a cada repetição.



O campeonato ainda era uma criança e não dava qualquer certeza de nada. Derrapávamos naquele início, e mesmo aquele jogo, com Thiago Santos de zagueiro, não tivemos uma atuação dos sonhos. Quem explica aquela alegria para o Zézinho G4, personagem criado agora, aquele tipo que mede a própria alegria pelo que ela vai lhe dar e não pelo que já lhe deu?



É provável que só este tipo de memória sem ligação direta com a importância matemática do jogo explique o fato de ainda existirem torcedores viajando para ver um jogo de futebol, e entenda por viagem até mesmo a saída de Mauá, Osasco, São Bernardo, Barueri. A polícia carioca, indo para a questão das viagens interestaduais, desde sempre segura ônibus em pontos da estrada e força a chegada atrasada de torcedores paulistas nos estádios. Cansamos de ver, pela TV, nossa torcida surgindo do nada após um 1º tempo ausente. Alguma coisa alheia ao jogo em si faz o camarada ir de novo e de novo para assistir um jogo que não assiste. Me intrigava moleque, me encanta adulto.



A bola está pingando para o comentarista esportivo obsoleto que viu o tempo passar, a barriga crescer e as habilidades de reflexão atrofiarem ("são uns desocupados vagabundos", dizem, e deus me livre de cuidar da vida dos outros). O mundo nos engole, é relativamente curto o tempo em que conseguimos, sem esforço, entender alguma parte do que nos aparece à frente - você lê agora mesmo um dos que nada entende, mas que de preguiça e tédio não há de morrer. Viajam por quê? Ué, e torcem por quê? Quando criança perguntei ao meu primo o motivo de girafas existirem, e ele respondeu questionando o motivo de eu existir. Ele estava certo. Talvez eu exista para de vez em quando ter umas folgas e jogar um boliche, cantar num karaokê e tomar uma cerveja. Sempre vou defender que joguem boliche e cantem em karaokês, mesmo detestando as duas atividades. Aprendi cedo a defender as girafas de minha vida para que um dia defendessem a minha cerveja.



Eles viajam para ter uma história simples pra contar, uma risada a mais com um amigo engraçado, ou só para que o domingo seja diferenciável dos outros domingos insuportáveis nas três décadas em que o Faustão só mudou a cor do relógio.



O desaforo vem de todos os lados. Inclusive do clube que se cansou de você e quer se adequar a um novo modelo, ainda que este novo modelo precise de vinte shows por ano, o que compromete o gramado, que por sua vez é atrapalhado pela cobertura, que vale a pena pois nos protege da chuva, e quer saber, tem grama sintética hoje em dia, e além do mais quem usa sintética como mandante ganha 14,59% de jogos a mais, então tá bom. Como torcedor, aprendi a não esperar, por parte de quem cuida do nosso futebol, o mínimo gesto de franqueza - com o advento do Perfil Engraçadinho de Twitter e a consagração das Notas Oficiais, quem ainda precisa de diálogo? Nem dói. Só fico realmente ferido quando torcedor desconhece torcedor, e me refiro tanto ao palmeirense que "comemora" o que aconteceu domingo com a torcida corinthiana no Maracanã, quanto ao, bem, duelo com o espelho que vivemos da Turiassú pra fora.



Tão bonita foi a festa popular na final da Copa do Brasil. E perigosa também, quase insustentável, e, testemunha que fui do tamanho daquilo, aceitaria medidas de controle, desde que feitas com argumentos razoáveis, técnicos, estudados e claros, visando a segurança real, não hipócrita, prevendo, para breve, a repetição de um cenário cuja mistura de sentimentos e líquidos pode causar explosão. Grades que amanhecem sem aviso prévio e limitam a entrada na rua sem critério uniforme de conferência de qualquer coisa não é uma ação aceitável. Grife bem: é inaceitável. Não é honesto com quem bebe uma cerveja honesta, nem leal com quem topa e apoia uma ação leal. O mesmo vale para os dias seguintes às brigas de estádio, quando a narrativa desvairada não sente falta de valores técnicos, como se ninguém se importasse com a melhor forma de se tratar o torcedor inocente na tentativa (?) de pegar o violento.



É para este tipo de pauta que uma vez, décadas atrás, torcidas organizadas foram criadas. Fiscalização e canal de diálogo. Uma forma de toda questão sensível à arquibancada ter gente que a frequenta com voz ativa. Virou o que virou, e hoje a Polícia Militar, só por ter o poder, se acha no direito de cobrar uma carteira de sócio-torcedor, que não é documento de nada nem diz respeito a ela, para te dar ou negar acesso à rua. Fazem isso com pessoas que não se sentem representadas por ninguém e tampouco pretendem representar alguém, um monte de gente boa e cheia de energia que se desgasta analisando manchete negativa em site sem graça.



Tão bela queremos a festa do título que, nesta segunda, surgiu a ideia da propria torcida, organizando-se espontaneamente para tal, limpar as ruas após os jogos, já que esta tecla é tão batida pelos autointitulados síndicos do bairro. Com os japoneses na Copa do Mundo foi um sucesso de mídia, até o papagaio da Ana Maria Braga gostou. Não que vá ter muito o que limpar, posto que o cerco aos vendedores ambulantes está forte, mas vale o exercício, é mais um gesto prático e pacífico de quem ainda quer acreditar que a sujeira não somos nós mesmos, e a polícia é a vassoura do dono da casa, da rua, de onde, com a permissão de Jards Macalé, muitos estão a um passo (de novo!) do despejo.



Já comi muito da farinha do desprezo



Não, não me diga mais que é cedo



Quanto tempo amor, quanto tempo tava pronta



Que tava pronta da farinha do despejo.




+ + +



Oooooo Porco!



Outro movimento espontâneo da torcida tem a ver com o tal grito do "bicha" no tiro de meta, pauta que o amigo Fernando Cesarotti defende com imensa categoria, mostrando com firmeza o ridículo do gesto, pela óbvia ofensa a tantos de nós, além da - já bastaria se fosse só isso - breguíssima falta de originalidade. Quando o hino nacional virou "meu Palmeiras", o canto nasceu tímido mas destinado ao sucesso. É simpático e criativo.



O Sport, domingo, cobrou poucos tiros de meta, mas deu para ouvir o grito novo. A substituição do "bicha" pelo "Porco" no apupo ao goleiro rival me parece uma questão de jogos para se tornar natural, e é este tipo de coisa que reforça o caráter de uma arquibancada e dá musculatura ao ambiente coletivo. Pra cantar o que qualquer uma canta, fico em casa. O Palmeiras é menos igual aos outros e mais rico por dentro quando a torcida mostra este tipo de fôlego.



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7431 visitas - Fonte: ESPN FC

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